Preparo físico para atletas de E-Sports: técnica e psicologia esportiva

Esportes eletrônicos ou E-Sports trazem uma nova perspectiva da expressão esportiva. Mas, exatamente, o que são os E-Sports? Hamari e Sjöblom (2017, p. 211) definem como “uma forma de esportes em que os principais aspectos do esporte são facilitados por sistemas eletrônicos; a entrada de jogadores e equipes, bem como a saída do sistema E-Sports são mediadas por interfaces homem-computador”. Miah (2016) destaca que os esportes eletrônicos sugerem uma transformação para a compreensão da distinção entre as experiências mundiais físicas e digitais, um conjunto inteiramente novo de relações entre os meios de comunicação, patrocinadores e produtores de eventos, uma nova economia de provisão de mídia e um sentido completamente alterado do que será o esporte no século 21. Os esporte digitais, os exergames, os E-Sports e os ciberesportes têm desafiado a conceituação clássica e hegemônica do que é o esporte (VAN HILVOORDE e POT, 2016).
Alguns órgãos esportivos não reconhecem ainda integralmente os E-Sports. Independente da classificação que os órgãos de regulação do esporte queiram dar ou da taxonomia acadêmica é certo que o movimento do E-Sports tende a ampliar, intensificar e estimular novos mercados, tecnologias e contexto de aplicação, estudo e pesquisa. Contudo, a mídia já os descobriu e não perdeu a oportunidade. Canais com ESPN, SPORTV, BANDSPORT e FOX, dentre alguns, criaram programas dedicados aos E-Sports e têm transmitido as competições e premiações ao vivo. Os atletas e equipes tradicionais também já voltaram sua atenção, pois é comum a transferências das estrelas dos grandes esporte para os videogames/E-Sports. Os grandes atletas do futebol, NBA (National Basket Association), NFL (National Football League) entre outras modalidades têm seus próprios títulos em que os fãs podem interagir e jogar com os avatares de seus ídolos, gerando uma nova forma de ganhos financeiros para eles.
E as questões físicas e psicológicas dos E-Atletas? Neste sentido Witkowski (2012) destaca que os E-Atletas estão fisicamente envolvidos de maneiras diferentes, por exemplo, têm um corpo equilibrado que não está imitando os movimentos de seu avatar e está envolvido de forma háptica por meio do seu teclado e mouse para dirigir seu avatar. É fundamental compreender que há complexas relações de habilidade motoras finas requeridas na prática dos E-Sports. Apesar de diferir na intensidade dos movimentos, os E-Sports requerem habilidade complexas e coordenadas, capacidade de “deslocar” o corpo e/ou ferramenta que é utilizada para deslocar ou objeto (VAN HILVOORDE e POT, 2016) e níveis elevados de concentração e tomadas de decisões em razão das dinâmicas impostas pelos jogos. Nos jogos que exigem uma formação em equipe as habilidades psicossociais são diversas e não diferem dos esportes tradicionais, tais como: comunicação, liderança, coesão, foco e concentração, tomada de decisão em equipe, velocidade de raciocínio, velocidade de reação, coordenação motora finas e complexas. E há confronto com oponente (s) de forma mediada pela máquina.
No sentido fisiológico, Rudolf e colaboradores (2016) mostraram que os jogadores de E-Sports estão expostos a estresse e tensões fisiológicas durante as competições, que suas frequências cardíacas em média ficam em 100 bpm (batimentos por minuto) com picos entre 160 a 180 bpm e que os níveis de cortisol são similares aos de atletas do automobilismo e, portanto, os níveis de tensão e estresse são similares aos seus pares esportivos tradicionais. Em outro estudo desenvolvido por Kari e Karhulahti (2016) encontraram 3 questões importantes: 1) a imprensa tende a exagerar o tempo que estes atletas efetivamente treinam, algumas publicações apontadas pelos autores relatam que os E-Atletas gastavam 12-14 horas em treinamentos. Enquanto em seu estudo, eles encontraram uma média de 5.2 horas e que na realidade essas 12-14 horas são preenchidas com outras atividades, similares aos seus pares esportivos tradicionais com: reuniões com a equipe, análise de vídeos, estudo das estratégias, eventos com patrocinadores, entrevistas, etc.; 2) que os E-Atletas são relativamente ativos nas atividades físicas tradicionais, despendendo cerca de 1.08 horas todos os dias com esse tipo de prática e 3) as razões por trás dos níveis de exercícios físicos relativamente altos de e-atletas de elite não são tanto em seu desejo de melhorar o desempenho competitivo, mas sim em sua maior conscientização sobre os benefícios de estilos de vida saudáveis.
Cabe ao momento, refletir sobre o tipo de campo profissional que o psicólogo do esporte pode atuar nessa emergente realidade, bem como suas possibilidades de atuação. Não podemos afastar que os E-Sports são um fenômeno recente e que é possível que comecemos a integrar com práticas de atividade física mais orientadas, em razão dos efeitos da preparação física e psicológica sobre a concentração, foco, resistência ao estresse, qualidade da recuperação física, entre outros.
De forma sintetizada, o professor de Educação Física, o psicólogo do esporte e demais profissionais que queiram atuar com os E-Sports devem além da busca profunda de conhecimento sobre a área esportiva, necessitam compreender como as tecnologias afetam os atletas e praticantes de E-Sports.
REFERÊNCIAS
HAMARI, J.; SJÖBLOM, M. What is eSports and why do people watch it? Internet Research, 27(2), 211–232, 2017.
HEERE, B. Embracing the sportification of society: Defining e-sports through a polymorphic view on sport. Sport Management Review, July, 2017.
JONASSON, K. Broadband and circuits: the place of public gaming in the history of sport, Sport, Ethics and Philosophy, 10:1, 28-41, 2016. DOI:10.1080/17511321.2016.1171250.
KARI, T.; KARHULAHTI, V. M. Do E-Athletes Move? : A Study on Training and Physical Exercise in Elite E-Sports. International Journal of Gaming and Computer Mediated Simulations, 8 (4), 53-66. doi:10.4018/IJGCMS.2016100104, 2016.
MARTONCIK, M. (2015). E-Sports: Playing just for fun or playing to satisfy life goals? Computers in Human Behavior, 48, 208–211, 2015. http://dx.doi.org/10.1016/j.chb.2015.01.056.
MIAH, A. Sport 2.0: Transforming sports for a digital world. Cambridge, MA: The MIT Press, 2016.
Flávio Rebustini – É pós-doutor pela UNESP e pela Universidade de Quebec em Trois-Rivieres. Coordena o curso de Pós-graduação em Psicologia do Esporte da Universidade Estácio de Sá. E-mail: frebustini@uol.com.br

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